Um longo lamento de impotência parece dominar, num primeiro momento, o gesto de luto e de perda. Em contrapartida, porém, irrompe a mobilidade intrínseca de um outro gesto que se ergue, que se levanta para realizar a sua evidência num acto de sublevação e transformação. O gesto estético capta a ausência e a derrisão, mas a partir dele instiga-se, também, o impulso da emoção e a razão da revolta. Se o êxtase do poder existe sob a condição da ausência, da inacção e da sujeição, por outro lado, surge espontaneamente o desejo, a vaga imperceptível do devir, a potência irresistível que tudo vem transformar. Neste processo, as imagens insistem em construir um espaço crítico de tensões, de transgressões, que configuram o nervo da acção política e colectiva.
Nos fragmentos que constituem esta breve sequência ensaística, percorre-se, com a mestria da citação benjaminiana, uma vasta amostra de obras e de concepções teóricas, visando compreender as múltiplas faces da força de insubordinação e levantamento. Ao incidirem na divergência radical entre poder e potência, são as relações ambivalentes entre submissão e insubordinação, entre revoltas e revoluções, entre manifestações estéticas e acções políticas, que se põem em confronto. Nos gestos estéticos de C. Marker, S. Eisenstein, T. Géricault, E. Delacroix, J. Vigo, H. Michaux, Goya, F. G. Lorca, G. Bataille, e através dos intercessores teóricos como A. Warburg, T. W. Adorno, G. Simmel ou W. Benjamin, assinalam-se essas dinâmicas de transmissão, de transformação e, sobretudo, o valor transgressivo do desejo enquanto potência de levantamento e insubordinação.