"Tudo nele era revolta": dessa maneira o poeta francês Rimbaud é definido por Thomas Bernhard no texto que abre esta coletânea, escrito em 1954, quando Bernhard tinha apenas 23 anos. Tais palavras tão categóricas podem muito bem se aplicar à carreira que o autor austríaco desenvolveu nas décadas seguintes. Afeito a polêmicas e controvérsias, Bernhard escreveu uma sequência de peças de teatro que atacavam as cidades austríacas onde eram encenadas, assim como seus habitantes, muitas vezes sem poupar os próprios festivais de dramaturgia que as contratavam. Nesta coletânea, podemos nos divertir com a chegada inesperada do autor à redação do jornal de Augsburgo, onde protestavam contra sua peça, quase como um happening.
Mais importante que isso, podemos matizar o estilo de Bernhard através de suas entrevistas e compreender que, por trás de tanta revolta, há humor e até mesmo ternura. Esses vislumbres são vistos em momentos mais pessoais, quando ele revela, por exemplo, o carinho que tinha pelo avô, o escritor Johannes Freumbichler, que tanto influenciou sua trajetória.
Na pista da verdade cobre quatro décadas de discursos furiosos, comentários irônicos e entrevistas intrigantes, partindo dos primeiros livros de poesia do autor e seu romance de estreia, até seus últimos dias, em 1989. Seus confrontos constantes não o impediam de se tornar um autor cada vez mais celebrado, e podemos contemplar como a idade não domesticou seu gênio, que seguia disparando contra o establishment da cultura europeia, formado por puxa-sacos e burocratas.
Mas, longe de ser apenas denúncia, em Bernhard transborda humor peçonhento. Afinal, como ele mesmo diz: "Tudo é cômico. Assim como na minha prosa, a pessoa nunca pode saber ao certo: devo agora gargalhar ou não?".