Em Performances do tempo espiralar, poéticas do corpo-tela, da coleção Encruzilhada, da Editora Cobogó, a ensaísta, poeta, dramaturga e professora traz ensaios nos quais Leda Maria Martins explora as inter-relações entre corpo, tempo, performance, memória e produção de saberes, principalmente os que se instituem por via das corporeidades. Em novas dicções, a autora consolida o conceito de tempo espiralar, que surge pela observação de práticas comunitárias e no fundamento cognitivo de vários grupos étnicos africanos – que nas Américas recriaram seus laços de pertencimento telúrico. Isso acontece, sobretudo, nas culturas fincadas na oralidade e na cosmovisão ancestral cujas práticas performativas celebram o corpo como lócus da memória. Essa percepção cósmica e filosófica entrelaça, no mesmo circuito de significância, a ancestralidade e a morte. O passado habita o presente e o futuro, o que faz com que os eventos, desprovidos de uma cronologia linear, estejam em processo de perene transformação e, concomitantemente, correlacionados.
No livro, a autora propõe que a experiência e a compreensão filosófica do tempo podem ser expressas por uma inscrição não necessariamente discursiva e mesmo não narrativa, mas não por isso menos significativa e eficaz: a linguagem constituída pelo corpo em performance, das liturgias do Reinado ao teatro e às artes cênicas.
Dialogando com outros pensadores como Alfredo Bosi e João Guimarães Rosa, Leda Maria Martins desconstrói a dicotomia entre oralidade e escrita enfatizada pelo Ocidente, que prioriza a linguagem discursiva como modo exclusivo de postulação de conhecimento. Performances do tempo espiralar, poéticas do corpo-tela apresenta uma temporalidade que se curva para frente e para trás, ao redor e para cima, em movimentos espirais que retêm o passado como presente (ou presentifica o passado) para moldar o futuro. Assim, a autora descoloniza o pensamento Ocidental e requalifica a África como continente pensante.